(Tópico para discussão interna dos institutos de pesquisa)
Maurício Costa Romão
Sob o título “Brasileiro quer mudança, mas com petistas”, recente matéria na Folha de S.Paulo (23 de fevereiro de 2014) mostra dados da pesquisa do Datafolha de fevereiro, na qual os brasileiros reiteram querer mudanças na condução político-administrativa do país, o que já fora detectado anteriormente pelo instituto na pesquisa de novembro passado:
“… Agora, 67% dizem desejar que o próximo presidente adote ações diferentes da atual administração. Desta vez, o Datafolha foi além no levantamento dos dias 19 e 20 e indagou aos entrevistados qual dos pré-candidatos a presidente estaria mais preparado para adotar as tais mudanças no jeito de governar o país” (grifo nosso).
Segue-se uma relação de nomes com as percentagens respectivas de respostas à dita indagação: Lula (28%), Dilma (19%), Joaquim Barbosa (14%), Marina (11%), Aécio (10%) e Eduardo (5%), nenhum e não sabe (12%). A pergunta foi estimulada, na qual se mostravam os nomes e o entrevistado só podia escolher uma das opções.
Como o texto afirmava que o Datafolha indagou quem desses nomes era mais preparado para “adotar tais mudanças”, supunha-se que os percentuais associados aos nomes fossem derivados do universo dos 67% que queriam mudanças.
Se assim fosse, poder-se-ia dizer, por exemplo, que dos 67% que desejam que as ações do próximo presidente fossem diferentes da atual gestão, 19% querem que elas sejam levadas a efeito pela própria Dilma. Quer dizer, algo como 12,7% dos eleitores.
Indo diretamente ao questionário do Instituto, observa-se, todavia, que a indagação consequente (“quem desses nomes…”) não está ligada à pergunta antecedente (“você prefere que a maior parte das ações…”). Na verdade, o questionário revela que se trata de duas questões completamente diferentes:
“P.6 AA Você prefere que a maior parte das ações do próximo presidente sejam, de um modo geral, iguais às ações da presidente Dilma Rousseff, ou que a maior parte dessas ações sejam diferentes da atual presidente? (Resposta estimulada e única, em %)”.
“P.6 BB Qual destes pré-candidatos ________________ está mais preparado para fazer mudanças no Brasil? (Resposta estimulada e única, em %)”.
O texto do jornal é desenvolvido a partir do pressuposto de que as duas perguntas estão relacionadas.
Já de pronto, o título da matéria (“Brasileiro quer mudança, mas com petistas”), faz uma ilação indevida: junta dois universos distintos, tratando-os como se um derivasse do outro. É um raciocínio falacioso, celebrizado na frase latina “post hoc ergo propter hoc” (depois disso, logo por causa disso).
O corpo da matéria, como não poderia deixar de ser, resvala para a mesma impropriedade técnica, pois o Datafolha não perguntou, no conjunto dos 67% dos entrevistados que queriam mudanças, “…qual dos pré-candidatos a presidente estaria mais preparado para adotar as tais mudanças no jeito de governar o país?”.
A pergunta foi outra muito diferente (vide P.6 BB).
Ademais, mostrando os nomes dos vários possíveis pré-candidatos numa mesma lista, a questão P.6 BB suscita alta correlação com intenção de votos, não sendo surpresa o resultado apresentado. Basta comparar as duas sequencias:
Pré-candidato mais preparado: Lula, Dilma, Barbosa, Marina, Aécio e Eduardo.
Intenção de votos (cenário C, na pesquisa de fevereiro): Dilma, Barbosa, Aécio e Eduardo.
Como Lula é sempre o primeiro em qualquer cenário, seu nome se conforma às duas sequencias. A única diferença é Marina, que aparece à frente de Barbosa em um dos cenários da pesquisa (cenário F).
Portanto, para se saber qual o pré-candidato que tem a maior preferência dos brasileiros para promover as mudanças reclamadas nas pesquisas, há que se formular uma pergunta (sempre no universo dos que querem mudanças) do tipo:
Qual destes políticos, os mais prováveis pré-candidatos a presidente (mostrar disco com Dilma, Eduardo e Aécio), você acha que pode realizar ações diferentes da atual administração?
Ou, reformulando ligeiramente:
Qual destes políticos, os mais prováveis pré-candidatos a presidente (mostrar disco com Dilma, Eduardo e Aécio), você acha que pode fazer as mudanças que você diz preferir?
Ou, ainda:
Você diz que prefere que o próximo presidente realize ações diferentes da atual gestão. Qual destes políticos, os mais prováveis pré-candidatos a presidente (mostrar disco com Dilma, Eduardo e Aécio), você acha que pode fazer essas mudanças?
A insistência em colocar no disco apenas os mais prováveis pré-candidatos deve-se a que essa é a composição do cenário que deverá prevalecer (Eduardo e Marina anunciam a chapa este mês, com o governador na cabeça. O ministro Barbosa e Lula já reiteraram inúmeras vezes que não são candidatos).
De qualquer modo, pode-se, eventualmente, substituir num cenário B, Dilma por Lula, Num cenário C, Eduardo por Marina e num cenário D, incluir apenas Barbosa ao cenário A (Dilma, Aécio e Eduardo).
Nessas sugestões de perguntas no universo dos que querem mudanças, cabe também uma questão espontânea.
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Maurício Costa Romão, Ph.D. em economia, é consultor da Contexto Estratégias Política e Institucional, e do Instituto de Pesquisa Maurício de Nassau. mauricio-romao@uol.com.br