Maurício Costa Romão
A sociedade assiste estarrecida à vergonhosa tramoia encetada por parte dos deputados estaduais para eleger pela quinta vez consecutiva o atual presidente da Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco (ALEPE).
O intento de suas excelências além de ilegal é eticamente reprovável.
Ilegal porque fere dispositivos constitucionais, conforme alertou a OAB-PE, através de parecer da Comissão de Estudos Constitucionais da entidade.
No documento da Ordem, estatui-se explícita e taxativamente que não é possível o atual mandatário da ALEPE ser reconduzido ao mesmo cargo no primeiro biênio da legislatura 2015-2018, “sob pena de ocorrência de grave inconstitucionalidade”.
Eticamente reprovável porque agride os princípios republicanos manifestos no art. 1º da Constituição Federal e interrompe a salutar alternância de poder que é própria dos regimes democráticos.
De fato, o requisito de mandato temporário dos cargos públicos contribui para evitar que o poder se concentre indefinidamente nas mãos de determinados grupos ou pessoas, aumentando a ocorrência de vícios, usufruto de vantagens indevidas e tentações autoritárias.
Emparedados por esses irrefutáveis aspectos – o legal e o moral – suas excelências buscaram uma saída tosca para o seu disparatado propósito: argumentar que o princípio da proporcionalidade (art. 73, § 2º do Regimento Interno) não deve valer agora porque tornaria o PSB o “PRI de Pernambuco”.
Quer dizer, o partido “já tem o governador, já tem o prefeito, já tem o comando da Câmara Municipal do Recife…” e ainda quer a presidência da ALEPE?
Ora, ora, ora. Hoje na oposição, e defendendo o quinto mandato na Casa, o PT há pouco tempo detinha a prefeitura, o comando da Câmara Municipal, a presidência da República, um senador, secretarias no governo estadual e um aliado na presidência da ALEPE. Por essa linha de argumentação, o PT, à época, não seria também o PRI de Pernambuco?
Suas excelências não vivem alardeando que os poderes executivo e legislativo são independentes? Então qual é o problema de um mesmo partido ocupar os dois cargos principais dessas instâncias? O governador governa para Pernambuco, não para o PSB, assim como o mandatário da Assembléia dirigiria a Casa da representação do povo de Pernambuco, não a dos filiados ou simpatizantes do PSB.
Ademais, o que é que tem a ver o prefeito ser do PSB e o mesmo partido ocupar o cargo de presidente da ALEPE?
Por último, o mais grotesco: modificar casuisticamente a Constituição estadual para permitir que uma mesma pessoa ocupe a presidência por sucessivos mandatos na ALEPE e que, a despeito de notória agressão legal, se intente uma nova reeleição, não tem nenhum problema de “concentração de poder”.
Agora, um partido que circunstancialmente ocupa o governo do estado e a prefeitura da cidade do Recife, e que teve o maior número de parlamentares eleitos para a Assembléia e, portanto, se credencia a reivindicar a titularidade da Casa, incorre no sacrilégio de querer poder em demasia.
Muita gente lembra de um notável comercial antigo da Casa Lux Ótica em que num determinado trecho se dizia: “quando a gente não quer, qualquer desculpa serve”. Não poderia ser mais apropriado recordá-lo…
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Maurício Costa Romão, é Ph.D. em economia. mauricio-romao@uol.com.br, https://mauricioromao.blog.br.
Excelente artigo.Título impecável. Não tinha como o Parecer da Procuradoria da AL ter consistência. Onde já se viu discutir a aplicabilidade de uma norma que já foi aplicada e já beneficiou o próprio Guilherme Uchoa e que determina a vigência da vedação para o biênio que se inicia? Onde vedar não significa proibir? Só mesmo nesta Assembléia!!! As normas constitucionais são as regras preliminares que permitem o desenrolar do jogo político em uma democracia, garantindo legitimidade ao sistema.Sua violação é preocupante, principalmente, pelo contexto político em que se insere. Os pernambucanos deveriam ir a essa posse com nariz de palhaço, já que estão sendo representados por aqueles que aprovaram a própria norma que agora violam, usando argumentos risíveis para fazê-lo.