Carlos Heitor Cony
Folha de S.Paulo, 21/09/2010
RIO DE JANEIRO – Semana passada, aos 70 e tantos anos, Brigitte Bardot fez declarações que trouxeram seu nome à mídia internacional. Entre outras coisas interessantes, ela disse que ao longo de sua vida pensou diversas vezes no suicídio e que a política a enojava.
Ela dividiu, com Marilyn Monroe, a condição de incontestável símbolo sexual. Enquanto a americana morreu cedo, em condições até hoje misteriosas (falaram em suicídio por causa do relacionamento com os dois Kennedys, John e Bob), a francesa retirou-se na Côte, cuidou de cachorros e defendeu as baleias.
Deve ter tido seus motivos para enojar-se da política. Muita gente também sente asco não só pela política mas pela vida pública em geral. Todos têm suas razões.
No meu caso, não posso falar em nojo, mas em desencanto. Aos 20 anos, saído do seminário, enfrentei os abrolhos do mundo. Sabia latim, mas não sabia tomar um bonde. Toda vez que o condutor passava pelo meu banco, eu pagava a passagem novamente -e o filho da mãe sempre aceitava.
Deu-se que o pai me apresentou a um engenheiro que testou minha redação: pediu que fizesse o discurso de posse de um imaginário prefeito do Rio. Três laudas, não mais. Sozinho numa sala de seu escritório, desovei o texto, falando nos problemas da época: enchentes no Catumbi e desmonte do morro de Santo Antônio. Prometi resolver os dois problemas.
O engenheiro leu, guardou o discurso na gaveta, considerou-o mais ou menos. Um mês depois, ele foi realmente nomeado prefeito do Rio, então Distrito Federal. Ouvi pelo rádio o seu discurso de posse. Prometia acabar com as enchentes do Catumbi (que nunca acabaram) e desmontar o morro, que só foi desmontado 20 anos depois.
Radicalizei. Política e vida pública, nunca mais.