
Por Maurício Costa Romão
“Acho que os políticos deveriam deixar de ser hipócritas. Eles deveriam solicitar ao TSE que proibisse totalmente toda e qualquer pesquisa eleitoral antes das eleições. É a única alternativa que faz sentido, pois em toda eleição ocorre a mesmíssima coisa: os candidatos que perderam “culpam” as pesquisas eleitorais, levantam suspeitas em relação à sua lisura, reclamam que o comportamento do leitor foi influenciado, etc. Se na eleição seguinte os mesmos candidatam ganham, o comportamento muda completamente. Ou seja: as pesquisas “erram” ou “acertam” de acordo com o humor do candidato e os resultados da eleição….” [Renato Sabbatini, Jornal Correio Popular, Campinas-SP, 09/10/1998].
As pesquisas eleitorais mexem com as emoções das pessoas. Causam alegria e tristeza, entusiasmo e desânimo. Afetam corações e mentes. Daí por que são alvo de tantas e veementes reclamações em todos os pleitos majoritários.
Os eleitores não conseguem desprender-se dessa carga de emoções, ser isentos, equilibrados, quando lêem os resultados das pesquisas.
Se os números publicados estiverem em consonância com suas expectativas, vale dizer, se são bons para o seu candidato, então as pesquisas são consideradas naturais, condizentes com o que delas já se esperava: “expressar o clima das ruas”, “o sentimento do povo.” Há como que uma percepção compartilhada de normalidade, uma acomodação crítica. Os institutos de pesquisa estão certos. Os resultados são os que eram para ser.
Se, de outra sorte, os resultados das pesquisas não baterem com as expectativas, então as contrariedades serão imediatamente manifestadas através das mais variadas reclamações sobre a idoneidade dos institutos e a qualidade técnica das pesquisas. Os institutos são vistos então como inimigos, imputam-lhes interesses venais, acusam-lhes de estarem mancomunados com os adversários, e por aí vai.
Ademais do contexto emocional, uma boa parte da reação do público, do eleitor comum, aos resultados das pesquisas, está vinculada ao desconhecimento quase generalizado das características estatísticas e metodológicas que emolduram a concepção desses levantamentos e do real significado de seus resultados.
É oportuno ilustrar o argumento com um exemplo concreto relativo ao último embate presidencial no Brasil. As pesquisas do Vox Populi (Dilma 41%, Serra 33%) e do Datafolha (Serra 37%, Dilma 36%) publicadas sexta (23/07) e sábado (24/07), no primeiro turno da eleição de 2010, mostram bem esse clima tensionado referido, o qual se instalou visivelmente entre os eleitores das duas candidaturas líderes na corrida presidencial passada.
Com a divulgação quase simultânea das duas pesquisas, apresentando resultados diferentes, os adeptos de Serra, diziam que que o Vox Populi estava a serviço do governo Lula; os seguidores de Dilma, propagavam que o Datafolha (leia-se Folha de S.Paulo) queria alavancar a candidatura de Serra.
Cabe observar, de saída, que os dois institutos trabalham com distintas metodologias e, portanto, os desenhos de concepção de suas pesquisas são diferentes (abordagem ao entrevistado, modelo de questionário, sorteio do universo, quotas, ordem das perguntas, etc.).
Uma rápida inspeção à tabela que acompanha o texto já fornece algumas diferenças metodológicas entre os dois levantamentos: tamanho da amostra, data da coleta e erro amostral máximo.

Há ainda inúmeras outras distinções: método de coleta (Datafolha: ponto de fluxo, que é a abordagem ao entrevistado em ruas e locais mais movimentados; Vox Populi: residencial), partido do candidato (Datafolha: não informa ao entrevistado; Vox Populi: informa), grau de conhecimento que o entrevistado tem do candidato (Datafolha: só pergunta depois da declaração de intenção de voto; Vox Populi: pergunta antes), cenários só com os três principais candidatos (Datafolha: não faz; Vox Populi: faz), etc., etc., etc.
Deduz-se daí que os números das duas pesquisas não podem ser diretamente comparáveis porque os levantamentos são metodologicamente distintos. Mas qual deles está “mais correto”? Cada instituto defende seu método como apropriado às circunstâncias, e não entra no mérito do utilizado pelo concorrente. O caminho trilhado por cada qual leva ao mesmo lugar. A rota escolhida é que é uma questão de preferência.
As pesquisas não são infalíveis. Erram. Mas entre erros de estimativa e fabricação de resultados há uma distância quilométrica. A permanência de um instituto de pesquisa no mercado depende crucialmente de sua credibilidade. Quem vai decretar seu próprio fim, perdendo-a?