NEM TUDO MUDA

 

Gustavo Krause

 Blog de Jamildo, 05/04/2011

Terça-feira, 05 de abril, recebo a edição do JC de roupa nova (atenção: sou assinante e leitor compulsivo dos jornais pernambucanos e outros de fora). O editorial justifica a mudança. Simples. Tudo muda e, no mundo moderno, em ritmo vertiginoso e dentro de um quadro de competição implacável. As pessoas, as organizações, as instituições não têm alternativa: ou mudam, em sintonia com o novo tempo, ou desaparecem; na melhor hipótese, viram fósseis, objetos, no futuro, da curiosidade arqueológica.

Com efeito, esta regra, que parece não comportar exceções, apresenta rochosa resistência quando se trata do sistema político brasileiro. A propósito, nos dias subseqüentes ao pleito de outubro, a história se repete: notícias e mais notícias sobre reforma política, tema que, como costuma acontecer, entra na agenda política como se fosse pra valer. Criam-se comissões; escrevem-se artigos; chovem propostas; cada cabeça, uma reforma e se busca, de marré, marré, o consenso improvável.

Fiz uma jura: não falar, não escrever, não gastar um minuto sobre o assunto, o que, aliás, não tem a menor importância na ordem das coisas. Apenas, a manifestação pessoal de ceticismo insuperável (palmas para quem acredita na possibilidade de reformar o sistema político). Acrescento, apenas, que o ceticismo tem uma consistente razão: não acredito que os beneficiários do sistema anacrônico de acesso ao poder promovam uma reforma que contrarie os próprios interesses (na eleição de 2006, apenas 32 dos 513 deputados federais foram eleitos com seus próprios votos, ou seja, com número de votos acima do quociente eleitoral e, na eleição de 2010, foram eleitos 35).

Como no samba, quebrei minha jura, quebrei, tão somente, para reforçar o meu ceticismo.

Como não acredito em metamorfoses ambulantes, por que não começar do simples para o complexo? Por que não eliminar distorções gritantes que estão na boca do povo? Por que não adotar um conservadorismo gradual e progressivo até se atingir o que é aceitável já que não existem sistemas perfeitos?

Todo mundo está cansado de saber que não funciona um sistema com duas dezenas de partidos. Cadê a cláusula de barreira que foi votada em 1998 para entrar em vigor em 2008? O STF julgou inconstitucional. Que se retome o caminho constitucionalmente adequado. Com siglas de aluguel, partidos cartoriais que servem aos mais escandalosos interesses, nada avança. Por outro lado, o que sobrou do conceito de fidelidade partidária, tendo por base decisão do STF (e não do Congresso) de que o mandato pertence ao partido e não ao candidato? Se o Congresso votar a norma de fidelidade partidária corre-se o risco efetivo de consagrar a imoral “janela da infidelidade”. Cadê a votação da regra que proíbe as coligações?

Todo mundo sabe que, ao votar, provavelmente estará elegendo o candidato em quem não votou e que o efeito “Enéas”, “Tiririca” e os “puxadores de voto” distorcem seriamente a vontade e, consequentemente, a representação popular. E mais: mil explicações não convencem o eleitor que um candidato menos votado se eleja frente a um candidato mais votado. Solução: “distritão” ou “distritinho”? A discussão vai para as calendas. Então por que não esterilizar as sobras do puxador de votos?

O Professor Maurício Romão, pernambucano, gente da gente, é um dos melhores analistas do tema e propõe solução simples. Mas é simples, então, não serve (tá lá no blog dele e em artigos publicados pela imprensa local).

Todo mundo sabe que o sistema proporcional, em lista aberta, e jabuticaba só existem no Brasil (Finlândia? Continua uma excentricidade) e o sistema proporcional em lista aberta induz a um luta intrapartidária canibalizante. E o que é pior: fomenta o balcão eleitoral onde a “mala preta” compra voto-mercadoria por atacado. Finalmente, todo mundo sabe que não haverá consenso sobre a reforma política, mas existe ampla e irrestrita convergência de opiniões, inclusive do eleitor, sobre o que não pode permanecer afetando o funcionamento da democracia brasileira. “Vamos ouvir a sociedade” é a fala escapista da encenação manjada.

Quando se quer, tudo muda; quando não se quer, nem tudo muda.

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