MUTATIS MUTANDIS

 

[Artigo do autor publicado no Jornal do Commercio (PE), em 14/04/2011]

Maurício Costa Romão

São inúmeras as distorções do atual modelo proporcional de lista aberta em vigor no país desde 1945. Não é à toa que toda vez que se inicia uma legislatura federal o tema de reforma do sistema eleitoral aparece como pauta prioritária, sem que até agora haja tido algum avanço. Por quê?

O Brasil é o único país do mundo que intenta fazer “reforma político-eleitoral” de uma vez, mudando tudo. Nas nações democráticas avançadas reforma política radical não faz parte de suas agendas. Seus modelos vão sendo aperfeiçoados à medida que deformações pontuais requerem intervenção (vide Inglaterra, recentemente). São apenas correções. Não há sobressaltos. Não há choque cultural.

Aqui, é o “ou tudo, ou nada”. Ora, como é que um país passa 65 anos adotando um sistema em que o eleitor vota diretamente no candidato de sua preferência e, de repente, se diz a ele, eleitor, que a partir de agora ele vota no partido e o partido é quem vai fazer uma ordenação interna de preferências?

Como é que o eleitor passa o tempo todo saindo de casa para votar em qualquer candidato, de qualquer parte do estado e, de repente, se diz a ele que a partir de agora o estado está fatiado em distritos e ele, eleitor, só pode votar em candidatos daquele distrito?

Como é que o parlamentar que vem há muito tempo sendo eleito e reeleito pelo sistema vigente e, de repente, se pede a ele que aprove nova legislação, adotando outro sistema, importado de experiências outras? Aqui cabe bem o dictum latino “ave Caesar, morituri te salutant” (“salve César, os que vão morrer te saúdam”; saudação dos gladiadores ao Imperador antes de entrarem em luta). Quer-se que os parlamentares sejam gladiadores…

Definitivamente, não é esse o caminho.

Primeiro, reformar o sistema eleitoral não significa necessariamente mudar de sistema. Segundo, todos os sistemas eleitorais têm distorções. Não existe sistema eleitoral perfeito e não há nenhum método de divisão proporcional justo (teorema de Arrow e teorema da impossibilidade de Balinsky e Young, respectivamente).

Terceiro, num mapeamento internacional de atributos desejáveis dos sistemas eleitorais (feito por Jairo Nicolau) tais como, (a) simplicidade; (b) proporcionalidade; (c) poder de escolha do eleitor; (d) partidos coesos; (e) grau de ligação do parlamentar com suas bases, alguns atributos são satisfeitos por uns sistemas e não por outros, e nenhum sistema satisfaz a todos os atributos.

Conclusão: a mudança de um sistema para outro envolve ganhos e perdas, já que todos os sistemas têm méritos e deméritos. Ganhos, ao absorver as vantagens do sistema a ser adotado e ao se livrar das desvantagens do que abandonou. Perdas, ao se desfazer das vantagens do que abandonou e incorporar as desvantagens do que vai adotar. 

A pergunta então é: por que ao invés de uma mudança radical não fazer lipoaspirações no modelo atual, extraindo suas deformações mais gritantes, como parte de um processo de aperfeiçoamento em direção a um sistema o mais próximo possível de algo como o de lista fechada, particularmente no que concerne à solidificação dos partidos, redução da fragmentação partidária e diminuição drástica dos custos de campanha?

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Maurício Costa Romão, Ph.D. em economia, é consultor da Contexto Estratégias Política e de Mercado, e do Instituto de Pesquisas Maurício de Nassau. mauricio-romao@uol.com.br

 

 

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