Editorial do Diario de Pernambuco
Recife, domingo, 18 de setembro de 2011
Estão em curso iniciativas que tendem desarticular a geografia política do país, com a intempestiva ideia de se implantar novos estados, através de projetos que se acham em tramitação no Congresso Nacional. Pelo menos 15 novas unidades podem surgir, em consequência desse furor legislativo, que atingiria, inclusive, o pequeno território do Distrito Federal, dando origem ao denominado estado do Planalto Central. A boa doutrina indica que a redistribuição do território nacional mediante incorporação, divisão ou fusão de estados só se justifica para atender a objetivos estratégicos do país. Entretanto, o Congresso vem atropelando essa doutrina.
Ele aprovou a realização de plebiscito no Pará com a finalidade de criar os estados de Tapajós e Carajás caso a consulta obtenha êxito. Os promotores da iniciativa serviram-se do permissivo abrigado no artigo 18, § 3º da Constituição para cobri-la de legalidade. Legalidade apenas formal, explique-se, uma vez que o redesenho do mapa amazônico exige amplo debate com a sociedade.
O que é grave também: não se procedeu a nenhum estudo de viabilidade, abrangente e ao mesmo tempo detalhado, como seria recomendável, sabendo-se que projeto dessa natureza mereceria um largo debate, envolvendo diferentes setores da opinião pública. O universo acadêmico, as instituições públicas e privadas competentes para avaliar os impactos resultantes do desmantelamento do Pará e os órgãos representativos do povo paraense foram ignorados da forma mais clamorosa possível. Restaram como únicos fiadores do absurdo alguns parlamentares com base eleitoral nas regiões que desejam transformar em estados. Na verdade, reduzi-las a feudos eleitorais, conforme o famigerado modelo do coronelismo. Mas o potencial de consequências desastrosas não se esgota aí.
É oportuno destacar, diante de tais iniciativas em fermentação no Parlamento, que a eventual existência de mais duas unidades federativas de primeiro grau na geografia do Pará cria riscos consideráveis. Áreas significativas da floresta amazônica poderão ser depredadas na esteira dos interesses políticos dominantes. Nada disso foi levado em conta, numa hora em que se busca fortalecer as políticas de defesa ecológica, como tem se manifestado a sociedade civil, através do posicionamento firme das instituições voltadas para o equilíbrio ambiental. Como se pode observar, o que se esboça no Congresso Nacional contraria as políticas preservacionistas referentes à região amazônica.
Saliente-se ainda que as regiões atingidas pelo projeto não dispõem de recursos próprios para alimentar a máquina administrativa dos novos estados. De saída, caberá à União bancar a instalação das instituições necessárias ao funcionamento das novas unidades federativas, pagando, inclusive, os salários do funcionalismo e outros dispêndios. Nessa perspectiva, o governo federal irá gastar cerca de R$ 2 bilhões anuais para suprir os déficits de ambas as unidades, conforme cálculo do Ipea. Todo isso pode acontecer numa hora em que se procura limitar os gastos públicos, a fim de que o país tenha condições de enfrentar com êxito problemas resultantes da crise internacional, que atinge os Estados Unidos e a União Europeia. Se semelhante iniciativa não convinha em tempos mais estimulantes, imagine-se consumá-la em ocasião sublinhada por crise orçamentária interna e turbulências externas. Ademais, é impertinência intolerável remeter ao contribuinte a conta abissal do oportunismo de meia dúzia de parlamentares. Acima de tudo estão os interesses do país. Essa legenda é que deveria animar as ações do Congresso, e não o contrário. Pelo menos é o que ensina o bom senso político.