Publicado no Jornal do Commercio – PE, em 10/09/20200
Maurício Costa Romão
As eleições de 2020 serão as primeiras sem as coligações proporcionais. Cálculos preliminares, com base em amostra de capitais e de alguns colégios eleitorais, apontam que 72% dos partidos (23 dos 32) que concorreram à eleição de 2016 teriam dificuldades de, disputando isoladamente, ascenderem ao Legislativo no pleito do ano em curso.
Por mais traumática que seja a experiência deste ano para muitos partidos, o grande impacto, entretanto, dar-se-á em 2022.
Uma coisa é a eleição de vereadores, os mais simples representantes da população na escala hierárquica de cargos parlamentares. Outra coisa é a eleição de deputados, principalmente os federais. Aí envolve questões financeiras (fundos partidário e eleitoral) e a própria sobrevivência dos partidos.
Por exemplo, o fundo eleitoral distribui recursos aos partidos proporcionalmente ao percentual de votos obtidos para a Câmara Federal, bem como ao tamanho das bancadas na Câmara e no Senado. Já para acesso ao fundo partidário (e ao tempo de rádio e TV), os partidos se submetem a cláusula de barreira de mínimo de votos válidos ou de número de deputados eleitos.
O fato é que o instituto das coligações proporcionais gerou certa acomodação no sistema, um jogo de ganha-ganha, criando zona de conforto para algumas agremiações (eleger parlamentares sem individualmente ultrapassar o quociente eleitoral, fazer cauda para siglas líderes de alianças em troca de vantagens, às vezes pecuniárias, eleger suplentes, etc.).
Com efeito, na média das últimas três eleições para deputado federal no Brasil, 86% dos parlamentares foram eleitos por coligações (87% em 2010, 88% em 2014 e 82% em 2018).
Daí a histórica resistência no Congresso em acabar com o mecanismo, o que só veio acontecer em 2017, como compensação à frustrada reforma política (leia-se troca de sistema de voto). Sua institucionalidade havia atingido o ótimo de Pareto: qualquer mudança alteraria o equilíbrio alcançado.
Quando a realidade das urnas vier à tona em 2020, é possível antever dois movimentos visando modificar a Carta Magna: (a) reintroduzindo as coligações proporcionais ou (b) mudando o sistema de voto do proporcional para o majoritário. Por último, não havendo guarida popular e parlamentar para tais investidas, recorrer-se-á a usual alternativa da judicialização: apelo ao STF.
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Maurício Costa Romão, é Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. mauricio-romao@uol.com.br