Maurício Costa Romão
As coligações proporcionais não são “uma invencionice praticada apenas no Brasil”, conforme vez por outra se apregoa por aí. O instrumento é utilizado em mais oito países democráticos. Aqui, todavia, pelas suas peculiaridades, as coligações são as responsáveis maiores pelas deformações do sistema proporcional em vigência.
Mesmo ciente dessas distorções, a maioria dos parlamentares da presente legislatura – boa parte da qual beneficiada pela atual sistemática eleitoral – defende a manutenção pura e simples do mecanismo tal qual ele é praticado.
A julgar pelos posicionamentos de lideranças partidárias, durante os debates da reforma política, , parecem ser remotíssimas, para não dizer nulas, as chances de o dispositivo ser expurgado agora do sistema eleitoral brasileiro.
Assim, um dos itens sugeridos pelo executivo federal para constar de um eventual consulta plebiscitária sequer constaria da cédula de perguntas.
O fim das coligações proporcionais, se ocorresse, não significaria, a contrario sensu, a concomitante depuração do sistema eleitoral vigente no Brasil. Longe disso. Restariam ainda várias distorções, algumas passíveis de correção simples, outras inerentes ao próprio sistema proporcional.
Mas, sem dúvida, ter-se-ia dado um grande passo na melhoria qualitativa do atual modelo, a começar pela revigoração dos partidos.
De fato, sem coligações somente partidos que ultrapassam o quociente eleitoral ascendem ao Parlamento, ao contrário do que acontece na sistemática atual, em que partidos abrigados em alianças podem eleger representantes sem lograr atingir tal quociente.
O corolário dessa restrição é cristalino: partidos de pouca expressão numérico-eleitoral tendem a desaparecer, pois sua principal moeda de troca – tempo de TV, aluguel de sigla e cauda eleitoral – não terá mais valor no lucrativo mercado das eleições.
Para sobreviverem, os partidos, nessa situação, incluindo os “ideológicos”, serão compelidos a fundir-se, diminuindo o número de siglas partidárias.
Outro ponto resultante do fim das coligações que concorre para o fortalecimento dos partidos é o de que o voto de legenda adquirirá imediato significado político-partidário, posto que, embora ainda misturado aos votos nominais, terá repercussão apenas na sigla à qual o voto for consignado.
No atual modelo, pode ocorrer o oposto, o voto de legenda se perde no interior da aliança e pode servir para eleger candidatos distintos do partido ao qual o voto foi concedido.
Não menos importante é o fato de que haverá maior identidade entre eleitor, candidato e partido, já que o voto em José, do partido ALFA, somente servirá para eleger o próprio José ou candidatos de ALFA, diferente de hoje, que se vota em José e pode-se estar elegendo João, do partido BETA.
Por último, será restabelecida a essência do sistema proporcional de representação parlamentar em que os candidatos são eleitos em consonância com a proporção de votos obtida pelos partidos, o que não acontece com o mecanismo brasileiro de coligações em cujo interior impera, no mais das vezes, a desproporcionalidade entre votos e cadeiras conquistadas.
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Maurício Costa Romão, Ph.D. em economia, é consultor da Contexto Estratégias Política e Institucional, e do Instituto de Pesquisa Maurício de Nassau. mauricio-romao@uol.com.br, https://mauricioromao.blog.br.