Por Maurício Costa Romão
Artigo do autor publicado no Diário de Pernambuco (PE), em 30/11/2010
Matérias jornalísticas recentes dão conta de que (1) foi aprovada na Comissão de C & T do Senado proposta do Senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), obrigando as pesquisas realizadas 30 dias antes do pleito (sic) terem que ouvir pelo menos 0,01% do eleitorado nacional, o equivalente a cerca de 13,5 mil eleitores, e (2) a deputada Íris de Araújo (PMDB-GO) apresentará projeto na Câmara, proibindo divulgação de pesquisas de intenção de votos 45 dias antes das eleições.
As propostas não fazem o menor sentido.
O nobre Senador associa tamanho de amostra à precisão, numa relação direta: quanto maior o tamanho da amostra maior é a precisão dos resultados. Não necessariamente!
Em 1936, nos Estados Unidos, a Literary Digest, uma famosa revista que desde 1916 acertava os vencedores das eleições presidenciais americanas, postou nada mais nada menos que 10 milhões de questionários endereçados aos eleitores, tendo um impressionante retorno de 2.376.583 intenções de voto. A partir dessa monumental amostra, a revista previu a vitória do republicano Alf Landon sobre o democrata Franklin Roosevelt por 57% a 43%.
Eis que aparece o sociólogo George Gallup, assegurando que quem iria ganhar a eleição seria Roosevelt, por uma diferença de 12 pontos percentuais, de 56% a 44%. E mais: para chegar a essa conclusão, seu instituto consultou apenas e tão somente 3.000 eleitores em todo os Estados Unidos!!!
Abertas as urnas, o resultado confirmou as previsões de Gallup, não obstante alguns pontos percentuais de erro nas estimativas dos números: Roosevelt ganhara de 61% a 37%. O problema é qua a Digest fez uma pesquisa “viesada” (usou apenas cadastros de proprietários de telefone e de carro) e, por conta disso, o imenso tamanho da amostra (2,4 milhões de questionários) não guardou correspondência alguma com a precisão.
A lição dessa história é que o importante de uma amostra não é o tamanho, mas sua representatividade do universo pesquisado.
Ademais, uma das principais fontes de discrepância dos números das pesquisas em relação aos resultados das urnas não depende do tamanho da amostra: trata-se do erro não amostral, proveniente de fatores ligados à metodologia da amostra e/ou à sua operacionalização em campo (questionários mal elaborados, despreparo técnico dos pesquisadores, dados sócio-econômicos defasados ou inadequados, supervisão de campo deficiente, etc.).
Isso sem se falar que os rigores da precisão têm seu custo: maiores tamanhos da amostra envolvem mais complexidades, mais entrevistadores, mais tempo de trabalho em campo, etc., o que implica custos financeiros mais elevados.
Por fim, uma fatalidade estatística: a partir de um determinado tamanho de amostra, aumentar esse tamanho tem impacto apenas marginal na precisão (cuja proxy é a margem de erro).
Por exemplo, uma pesquisa passar de 2.400 questionários para 38.400 produz uma diminuição da margem de erro (aumento de precisão) de tão somente 2,0% para 0,5%. Decididamente, não é por aí…
Já a nobre deputada, ao propor restrição à liberdade de divulgar pesquisas, está mais do que tolhendo o legítimo direito do público à informação. Está, na verdade, privilegiando apenas aqueles que podem pagar por ela e dela dispor da maneira que lhes aprouverem.
As pesquisas carecem de aperfeiçoamentos, sem dúvida, mas não através dessas amarras legais.
_______________________________
Maurício Costa Romão é Ph.D. em economia e consultor do Instituto de Pesquisas Maurício de Nassau. https://mauricioromao.blog.br, mauricio-romao@uol.com.br