AS PESQUISAS E A VONTADE POPULAR

Editorial do Jornal do Commercio, em 12.11.2010

Duas manifestações populares estão se tornando muito comuns nas temporadas eleitorais entre nós: uma diz que o poder político deveria ser entregue aos marqueteiros, outra, que no lugar de eleições a sucessão no poder poderia ser feita através de empresas de pesquisas de opinião pública. É a lógica do senso comum, fundada na repetição dos fatos.

Assim, se os candidatos se vestem, falam, dizem como vão atuar e o que devem fazer depois de eleitos segundo ditames dos especialistas em marketing, os marqueteiros, então, esses é que estariam, teoricamente, melhor preparados para assumir o posto.

De outro lado, um exemplo marcante acaba de ser visto no segundo turno das eleições presidenciais, quando as mais notórias empresas de pesquisa deram vitória antecipada à candidata que foi eleita no voto.

Entretanto, no percurso houve desencontros e mais de uma vez as pesquisas foram questionadas, tanto pela imprecisão quanto pelo que já foi dito à exaustão sobre o poder que têm de direcionar votos.

Assim, passadas as eleições, volta à discussão a questão das pesquisas eleitorais, que deverão ser tema de amplo debate no Congresso Nacional, como foram nos dias que se seguiram à votação e apuração de 3 de outubro. Já houve tentativas de se evitar a divulgação de pesquisas alguns dias antes das eleições e há no Congresso projetos proibindo, limitando ou estabelecendo regras para a divulgação das pesquisas.

A fundamentação é compreensível: baseia-se na constatação da existência de dados com erros gritantes, que terminam por contaminar a vontade do eleitor e comprometer a qualidade das eleições.

Pelo menos quatro grandes institutos estão postos hoje nesse mercado como luzes no acompanhamento das tendências. O primeiro, Ibope, no mercado desde 1942 e trabalhando com pesquisas eleitorais desde 1945, virou sinônimo de nível de aceitação ou rejeição. Está integrada em nosso idioma a expressão “isso dá – ou não – ibope”. Mas outras empresas conquistaram o mesmo prestígio como marcas respeitáveis – mesmo quando questionadas – no mercado de aferição da opinião pública, como Datafolha, Vox Populi e Sensus.

A grande maioria da população brasileira, em especial os 135 milhões de eleitores, tem dificuldades de entender como a aferição das intenções de votos de alguns poucos milhares é suficiente para antecipar a manifestação de vontade de tantos mais, dezenas de milhões de pessoas, de condições culturais e materiais inteiramente diferentes, de regiões com história própria – inclusive político-eleitoral.

E, no entanto, apesar do que pareceram erros gritantes no primeiro turno das eleições presidenciais, no fim os institutos terminaram cantando vitória ou, no mínimo, trazendo explicações convincentes, credenciando-se para os próximos confrontos.

Muito antes de a campanha assumir o grau de paixões e tensões que levaram a 3, e depois a 31, de outubro, um dos artífices desses institutos de pesquisa, Marcos Coimbra, do Vox Populi, dizia que “quem torce por um candidato olha qualquer pesquisa em que ele não aparece bem como se tivesse sido deliberadamente falsificada”.

E, para dar o toque que considera inquestionável desse trabalho no Brasil, ele informava que de 1989 até 2010 o desempenho médio dos principais institutos – Ibope, Vox Populi, Datafolha e Sensus – nas eleições presidenciais é melhor que dos congêneres americanos entre 1956 e 1996. “Nossa margem de acerto é significativamente melhor que a deles”, garante Coimbra.

Independente de aceitar como verdade incontestável o que diz o dirigente de um dos institutos de pesquisa, vai nos restar a tarefa de manter a visão crítica do processo. Até porque não se trata de um trabalho neutro, baseado apenas em dados estatísticos e probabilidades, mas um instrumento de comunicação que pode ser decisivo para uns e carrasco para outros, contaminando a mais formidável expressão da democracia.

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