Maurício Costa Romão
Contextualizando o problema
A literatura especializada destaca que nos pleitos eleitorais para deputado e vereador o princípio ideal da proporcionalidade é aquele segundo o qual o número de cadeiras conquistado pelos partidos concorrentes deve ser o mais possível proporcional aos votos recebidos. Esse é o alicerce do sistema proporcional, tanto o de lista aberta quanto o de lista fechada.
Na atual configuração do sistema eleitoral brasileiro, no contexto legal e operacional em que as coligações são permitidas, o princípio da proporcionalidade não é observado, como o é em alguns países. Constata-se, na verdade, pela evidência empírica das eleições, uma nítida alteração da vontade do eleitor expressa nas urnas: a ocupação das vagas parlamentares pelos partidos no interior das coligações não é feita em consonância com a proporção dos votos por eles recebida.
Quer dizer, se dois partidos, “A” e “B”, celebraram aliança, tendo “A” 70% dos votos e “B” 30%, então o princípio da proporcionalidade reza que, se a aliança conquistou 10 cadeiras, “A” deveria ficar com sete e “B” com três. Na sistemática brasileira, pode ocorrer o inverso, ou qualquer combinação de assentos entre “A” e “B”, justamente em virtude do modelo adotado no País.
A razão desse problema reside no fato de que nas eleições proporcionais no Brasil não há distribuição de votos intracoligação para efeito de alocação de cadeiras, de acordo com a votação correspondente de cada agremiação participante da aliança. O que é determinante no interior das alianças, de fato, é o somatório de votos individuais e de legenda, e não a contribuição proporcional dos votos de cada agremiação componente.
Os candidatos que receberem mais votos no interior da aliança são os eleitos, independentemente de que partido são egressos. É como se as agremiações desaparecessem no interior da coligação e, para efeito de cálculo de quem vai eleger-se, ela própria, a coligação, passa a funcionar como se um partido fora, uma vez que a votação é unificada internamente.
Instituindo a proporcionalidade
O procedimento para se instituir a proporcionalidade no âmbito das alianças inicia-se sem nenhuma modificação na sistemática vigente: o total de votos válidos de uma dada coligação, que resulta do somatório dos votos nominais e de legenda de todas as siglas componentes, deverá ser confrontado com o quociente eleitoral para definir quantas vagas cabem à coligação.
Depois, pelo método D’Hondt das maiores médias, determinam-se as vagas finais para todos os partidos (disputantes isolados) e para as coligações, da mesma forma como se procede atualmente.
Assim, já se sabendo pelo procedimento normal quantas vagas a coligação conquistou, faz-se, agora, uma radiografia interna para inicialmente pinçar do total de votos da aliança os votos de legenda, destinando-os aos partidos aos quais foram concedidos [lembrando que, no sistema proporcional brasileiro de lista aberta, faculta-se ao eleitor votar somente no partido (voto de legenda) ou diretamente no candidato (voto nominal)].
Note-se que, ao se computar os votos de legenda exclusivamente para as siglas às quais foram consignados, o cacife do partido, no seio da coligação, será tanto maior quanto mais votos de legenda se adicionem aos seus votos nominais, diferentemente do sistema atual em que os votos de legenda se perdem no emaranhado de votos da coligação, não conferindo “musculatura” ao partido para o qual fora destinado.
Distribuídos os votos de legenda dentro da aliança de acordo com sua consignação, calcula-se, a seguir, a proporção de votos (nominais e de legenda) de cada agremiação componente. As cadeiras serão alocadas a essas agremiações em consonância com tal proporção de votos.
Vê-se, assim, que a grande diferença para o modus operandi atual, em que a proporcionalidade não está assegurada, é que, agora, nesta sugestão, as coligações terão de, internamente, distribuir as vagas que lhes couberam, em consonância com a proporção de votos obtida pelas agremiações componentes, separando, necessariamente, os votos de legenda dos votos nominais.
Registre-se que haverá dois efeitos simultâneos importantes neste mecanismo proposto.
Primeiro, o voto de legenda adquirirá imediato significado político-partidário, tendo repercussão apenas na sigla à qual o voto é conferido. Respeita-se, assim, a vontade do eleitor e, consequentemente, aproxima-o filosoficamente do partido ao qual endereçou seu voto de confiança e apreço.
Segundo, se o princípio da proporcionalidade estiver sendo adotado, quanto mais votos de legenda determinada sigla conquistar, mais chance terá de aumentar seu quinhão na distribuição de cadeiras dentro da aliança. Haverá, portanto, incentivo aos partidos para valorizarem sua sigla na campanha eleitoral, chamando a atenção para seus princípios, conteúdo programático, etc.