Maurício Costa Romão
A julgar pelos resultados das eleições de 2020, o fim das coligações proporcionais prenuncia um salutar processo de diminuição de siglas no Brasil, ficando apenas as mais estruturadas e competitivas.
Tal processo é auxiliado pela cláusula de desempenho partidário, que estabelece regras para acesso ao Fundo Partidário e ao tempo de rádio e TV. Pelos dados do pleito municipal do ano passado, perto de 60% das siglas oficiais teriam dificuldades de cumprir com os requisitos da cláusula de desempenho em 2022.
Diante dessa perspectiva, há grande movimentação no Congresso Nacional no sentido de rever a legislação resultante da reforma eleitoral de 2017. Entretanto, haverá muita resistência em flexibilizar a cláusula de barreira – uma grande conquista histórica – ou trazer de volta as coligações proporcionais, apontadas como a maior deformidade do sistema de lista aberta.
Alternativamente, os parlamentares pensam em ressuscitar a proposta de “federação de partidos”, já discutida na Câmara no bojo da PEC 282/16 e retirada do texto antes da votação final por falta de consenso mínimo. O intento, sem meias palavras, é amenizar os rigores da legislação, dando sobrevida eleitoral e financeira a boa parte das siglas.
Na federação, os partidos, resguardadas suas autonomias estatutárias, podem unir-se, funcionando como se um partido fosse, com identidade única, obedecendo a uma mesma linha ideológico-programática, votando matérias conjuntamente, e obrigados a permanecerem nesse modelo durante o período da legislatura.
Na versão da PEC, a federação seria repetida nos estados, porém se facultava aos órgãos partidários nacionais decidir se a ela se reproduziria nas eleições municipais. O texto da PEC deixava muitos pontos sem esclarecimento, remetendo à legislação ordinária definição de regras sobre o mecanismo das federações nas casas legislativas e no processo eleitoral.
Assim, sem aclaração, a proposta suscita fundadas suspeitas de que se trata, na prática, de retorno camuflado das coligações, exceto quanto à obrigação dos partidos continuarem unidos na vigência do período legislativo. Antes, as alianças se desfaziam tão logo findassem as eleições, explicitando o seu caráter meramente eleitoreiro.
Além da complexa questão da verticalidade e seus impactos nos arranjos políticos locais, a federação se propõe a unir partidos que, em sua grande maioria, não têm identidade ideológica, desempenham seus misteres com base em interesses próprios, personalísticos, cartoriais, com pouca ou nenhuma afinidade programática. Que resultados de qualidade legislativa se poderiam esperar de tais ajuntamentos?
As mudanças constitucionais de 2017 – fim das coligações e cláusula de desempenho – revelam-se fundamentais para atuar sobre a fragmentação do sistema partidário brasileiro, compactando-o quantitativamente ao longo do tempo, com promissores ganhos de qualidade.
Alterações nessa legislação, às duras penas estatuída, devem ser prontamente repelidas pela sociedade. O caminho alternativo recomendável para os partidos com insuficiente envergadura eleitoral, de perpassar os rigores do novo regramento, é, indiscutivelmente, o de se estruturarem mediante fusão de siglas.
————————————————————————
Maurício Costa Romão, é Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. mauricio-romao@uol.com.br